20100614

O perigo a um clique: a internet também pode viciar


Por Elaine Vieira

Quantas horas por dia você passa navegando na internet? Se usa computadores em seu trabalho - como eu - provavelmente passa fácil das oito horas diárias, entre e-mails pessoais e profissionais, pesquisas na internet, notícias, redes sociais, entre outras tantas distrações disponíveis a um clique. Será que estamos exagerando?

Para muita gente, a resposta é sim. Há quem abuse da internet e chegue a um estágio que pode ser chamado de dependência, como ocorre com álcool, cigarro e outras drogas. Só que, nesse caso, se trata da chamada “dependência virtual”.

A estimativa é que 4% dos internautas desenvolvam o que a psicologia chama de uso patológico da internet ou Transtorno de Dependência de Internet (TDI). São pessoas que, depois de tanto tempo conectadas, não conseguem mais imaginar vida além da virtual e até quando estão off-line – desconectadas – se preocupam com o que está acontecendo na grande rede, explica a psicóloga Luciana Nunes, do Instituto PsicoInfo, do Rio de Janeiro, que desenvolveu uma terapia exclusiva para o TDI.

Limites
Mais do que o tempo gasto on-line – que, muitas vezes, não depende de uma escolha pessoal – são as emoções investidas na internet que diferenciam o uso do abuso. Afinal, numa sociedade cada vez mais informatizada, não dá para abrir mão de estar conectado, mas não é saudável deixar relacionamentos, lazer e outras experiências reais para dedicar-se só ao mundo virtual.

“A parte mais difícil do tratamento é a conscientização de que se está investindo tempo e emoção demais na internet”, aponta a especialista. Ainda não se sabe exatamente o que faz com que uma pessoa seja mais propensa do que outras a desenvolver a dependência. “Não se sabe se é a internet que gera um quadro de depressão, por isolar as pessoas, ou se pessoas depressivas usam a internet como subterfúgio e acabam perdendo o controle”, destaca Luciana.

A verdade é que, quando alguém deixa de sair com os amigos, acorda no meio da noite para ver mensagens e tem dificuldades de se desconectar do mundo virtual é porque precisa de ajuda. E com cada vez mais pessoas comprando computadores e acessando a internet, a tendência é que o número de casos de dependência aumente, alerta Luciana.

Se você, como eu, não está entre os dependentes, mas vive plugado, tente, pelo menos, perder menos tempo na internet. Uma pesquisa realizada no Reino Unido mostrou que as pessoas desperdiçam, em média, dois dias de trabalho por mês em buscas inúteis pela internet, além de um terço do tempo total on-line sem um objetivo definido. Difícil é resistir a tantos links logo ali, a um clique de distância.

Ele criou táticas para evitar exagero
O programador Alexandre Alves Borba, 28 anos, trabalha e se diverte com a internet e, mesmo sem querer, acaba exagerando no tempo on-line. Com um netbook sempre a tiracolo, ele está conectado em todos os lugares, em casa, na faculdade e até em barzinhos e cafeterias. A naturalidade é tanta que Alexandre nem sabe quando termina a obrigação profissional e começa o lazer.

“Às vezes, fico mesmo meio antissocial. Quando o assunto fica chato numa rodinha de amigos, pego o computador e vou fazer outra coisa”, assume.

Mas, temendo exagero, ele criou algumas táticas: abriu mão de um celular com acesso à internet e também da placa 3G no netbook. “Assim, evito o abuso e, de quebra, economizo. Mas, com a oferta de redes sem fio em todos os lugares, acabo sempre me conectando”, conta.

A concorrência do mundo virtual com o real é tanta que ele já decidiu: quando sai com a namorada, deixa o computador em casa.

Crianças e adolescentes correm mais riscos
Se já é difícil para um adulto regular o tempo - e a qualidade - da navegação na internet, imagine para crianças e adolescentes. “Quanto mais jovem o usuário, maior o risco de um abuso se tornar uma dependência”, alerta a psicóloga Luciana Nunes, mestre em Saúde Mental.

Essa maior susceptibilidade ao vício ocorre porque o cérebro – principalmente a parte frontal do córtex, responsável pelos impulsos – de crianças e adolescentes ainda está em formação.

“Quando esse jovem utiliza as ferramentas interativas, provoca um padrão de estímulos e respostas mais intenso do que a maturidade biológica pode aguentar. Assim, vai ser preciso cada vez mais estímulo para ter as mesmas sensações, a chamada tolerância, da mesma forma que ocorre com drogas químicas”, explica Luciana Nunes.

Para evitar prejuízos na escola e na vida social de crianças e adolescentes, os pais devem ficar atentos e estipular limites para o tempo que os filhos ficam conectados, destaca Luciana.

A Sociedade Americana de Pediatria indica que até os 17 anos o tempo on-line não ultrapasse duas horas por dia.

Interação, fuga e anonimato atraem os internautas
Afinal, por que a internet é tão viciante? Justamente por sua principal característica: a interatividade. Afinal, poder interferir nos acontecimentos, expressar sua opinião, trocar ideias com outras pessoas e até publicar seu próprio conteúdo é muito mais atraente do que ficar parado em frente à TV ou mesmo ler um livro.

Junte a isso a possibilidade de anonimato e de evasão - aliviar a tensão, se distrair -, e você consegue entender por que, a cada dia, mais pessoas perdem ainda mais tempo com computadores.

“A internet é um ambiente que seduz pela sua possibilidade interativa, anônima e de evasão. As possibilidades no hipertexto são ilimitadas. Além disso, existe um retorno em tempo real que reforça a sua identificação com o meio, criando um condicionamento favorável ao uso”, explica a psicóloga Luciana Nunes.

Mas, então, por que algumas pessoas ficam viciadas e outras não? Normalmente, os viciados são aqueles que tentam compensar um déficit emocional na rede, o que caracteriza o uso patológico, que interfere no cotidiano do paciente, destaca Luciana.

Você é viciado em internet?

1 - Você fica mais tempo na internet do que com pessoas “reais”?
Se você costuma gastar suas horas com atividades on-line mais do que com pessoas da sua família, amigos ou de outro tipo de relacionamento, realmente você precisa ficar atento, pois esse é um dos primeiros sintomas do problema.

2 - Você não consegue manter seu próprio controle na internet?
Caso você se conecte na internet apenas para “dar uma olhada” e acaba ficando bem mais do que o planejado, cuidado! Esse pode ser um claro sinal de dependência da rede.

3 - Você acha que “sem a internet não dá para ficar”?
Por qualquer razão, você não pode estar on-line durante algumas horas e percebe-se ansioso ou com tédio ou irritado e quando volta a conectar-se fica bem de novo? Esse é um péssimo sinal!

4 - Você percebe a necessidade de diminuir o tempo online, mas percebe que ele só aumenta?
Caso você já tenha feito tentativas frustradas para diminuir o tempo de uso e vem notando que a cada dia que passa você permanece mais tempo conectado na net para ter a mesma satisfação, você pode estar desenvolvendo tolerância à internet e vai precisar de ainda mais tempo a cada dia.

5 - Você tem mentido ou disfarçado para os outros sobre o tempo que fica conectado?
Fique de olho se desde que começou a ficar mais tempo on-line você tem tentado enganar ou mentir para seus familiares ou pessoas mais próximas a respeito da relação que você estabelece com o tempo na internet.

6 - Você sente que sem a internet a vida não teria graça?
Algo está errado se não consegue mais sentir o mesmo prazer que antes nas atividades off-line ou se sente melhor na vida virtual do que em qualquer outra situação real. Ou ainda se tem notado que, desde que começou a usar com maior frequência a internet, vem sentindo-se irritado ou deprimido. Situações assim merecem atenção.

7 - Mesmo sem estar na frente do computador, preocupa-se com o que está acontecendo no mundo virtual?
Quando está envolvido em outras tarefas cotidianas e não pode estar on-line você chega à sua casa e corre para ligar seu computador (ou dá um jeito mesmo fora de casa) para ficar “inteirado” dos acontecimentos virtuais? Então, fique alerta.

RESULTADO

Se apresentar pelo menos quatro desses sintomas por um período maior do que seis meses, procure ajuda profissional para analisar essa dependência da internet.
Fonte: A Gazeta

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