20100405

Voz da paixão

foto: Vitor Jubini - GZ
Luiz Paixão, 85 anos, apaixonado por jazz, acaba de lançar um disco como cantor

Luiz Paixão chegou aos 85 anos e não quis que seu fascínio por jazz e bossa nova ficasse restrito ao quarto de sua casa onde guarda suas preciosidades, na Praia do Canto, em Vitória.

Ele resolveu encarar o microfone (algo que já faz, de vez em quando, no Wunderbar) e gravou o seu primeiro CD, em que canta 12 faixas com o acompanhamento do pianista Jorge Saadi. No repertório, "Devaneio", de Cariê Lindenberg; "As Time Goes By", tema de "Casablanca"; e as inéditas "Viver Vitória" e "Costa Pereira", do próprio Saadi.

O disco será distribuído gratuitamente conforme a procura de amigos ou desconhecidos. Funciona assim: se alguém quiser, ele faz a cópia. Aliás, essa atividade de compilar músicas em CDs virgens e depois distribuí-los tem levado o professor de inglês aposentado a dormir depois das três da madrugada.

"É impressionante como os nossos ouvidos são castigados hoje em dia. Internet, rádio e TV só despejam porcarias. Muita música que presta cai no esquecimento. Resolvi dividir minha paixão pelo jazz e pela bossa com todo mundo. Eu as separo em discos que acho fundamentais para esta ou aquela pessoa e depois as presenteio", explica.

Estantes
foto: Divulgação
No Cauê Clube: Moacyr Barros, Luiz Paixão, Therezinha Paixão, Vinicius de Morais (C), (Antônio Carlos Fernando Lindenberg) Cariê Lindenberg e Marinho Nogueira

Material para garimpar não lhe falta. Os CDs disputam espaço junto a estantes de fitas de vídeo, DVDs e pilhas de discos de vinil. No quartinho do professor, há verdadeiras pérolas, raridades de responsa, que deixam os entendidos fascinados. Como o disco autografado pela grande diva do jazz Billie Holiday. "O ator Lima Duarte, que eu não sabia que também era apaixonado por jazz, veio aqui, vibrou e me deu um abraço ao ver esse disco. Ele disse que, se eu quiser, tiro fácil, fácil uns 20 mil dólares", informa.

Mas a número um para ele é Ella Fitzgerald. "Todas as cantoras tentam parecer com ela. Não adianta. Ela é a deusa maior desse Olimpo do jazz", declara.

Paixão teve essa sorte: ao longo de sua trajetória, ele teve contato com grandes nomes da música nacional e internacional. Estudante de inglês, ganhou bolsa do governo americano nos anos 50 do século passado. O jazz o atraiu porque era mais um exercício para se praticar o idioma.

Para um fã de jazz, estava no lugar certo e na hora exata, já que testemunhou a última fase da chamada Era de Ouro da música americana. O rock ainda estava no berço. Por lá, além de Billie, encontrou-se com Stan Kenton e Dave Brubeck (que o reencontrou anos depois em Guarapari, numa temporada de verão).

Voltando ao Brasil, virou uma espécie de embaixador do jazz no Espírito Santo. "O Consulado dos Estados Unidos me enviava discos para que eu passasse para as rádios daqui. Era a estratégia da propaganda americana: dominar a simpatia dos países por meio do cinema e da música. Os LPs que eu achava interessantes emprestava para as emissoras. Mas pegava de volta", diz. Assim, foi fazendo sua coleção.

A chegada da internet foi "uma mão na roda" para ele. "Não tem mais fronteiras. Todo mundo hoje pode ter acesso a toda a história do jazz. Só fica sem saber quem não quer", declara.

Agora, modernidade só mesmo no computador. Jazz, para ele, não fica bem com "coisas novas demais". Ele se considera ortodoxo em matéria de estilo. Não se entusiasma pelas novas vertentes. "Quando se flerta demais com música eletrônica, a essência acaba desaparecendo. Definitivamente, não caiu no meu gosto", opina.

Com o seu disco, Luiz Paixão também se lembra do tempo em que, vejam só, era cantor de big bands. "Nos anos 60, eu me apresentava nas rádios de Vitória sob dois pseudônimos: Bill Philips ou Sanclair. Não queria chamar público. Mas hoje os tempos são outros", finaliza.

"É impressionante como nossos ouvidos são castigados hoje em dia. Muita música que presta cai no esquecimento."

Luiz Paixão , 85 anos, jazzófilo

Faixa a faixa com Luiz Paixão

Devaneio - "Não tinha como abrir o disco sem essa composição do próprio Cariê Lindenberg e do Jorge Saadi."

All Of Me - "Me recorda meu encontro com Billy May, pistonista da banda do Glenn Miller."

You Go To My Head - "A letra é fantástica e mexe muito comigo. Tem todo um clima de sedução"

Blue Moon - "Uma das primeiras canções que eu cantei quando era crooner."

Costa Pereira - "É do Jorge Saadi. O legal dela é que tem uma levada de choro."

It?s Wonderful - "Uma das maiores composições dos irmãos Gerswhin."

Marina - "Caymmi é necessário, é fundamental. Resolvi cantá-lo mas numa versão minha, em inglês."

É - "Vocês terão oportunidade de ver meu manejo em fazer letra e música."

As Time Goes By - "Clássico do filme ?Casablanca?. É uma das minhas indispensáveis."

You?ll Never Know - "É romântico, do jeito que eu gosto."

Vitória-Rio Flight - "Lembrando nossos tempos de rapaz, nossa farras nos bares, quando a bossa nova começa a aparecer."

Viver Vitória - "É um chorinho pra lá de simpático."

Para adquirir o CD: (27) 3227-5892.

A Gazeta | Marcelo Pereira

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